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5 de julho de 2011

O que será que o pessoal da ANAC anda fumando?

A aviação comercial brasileira amargou, no ano passado, uma perda de R$ 640,8 milhões com a sua atividade principal, o transporte de passageiros no país e no exterior, conforme divulgou ontem o Anuário do Transporte Aéreo de 2010, da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Nos últimos cinco anos, as empresas brasileiras acumulam prejuízo de R$ 5,7 bilhões. Nesse mesmo período a demanda doméstica cresceu 96%.
O levantamento da Anac considera o chamado resultado de voo, que exclui operações financeiras e receitas auxiliares (venda de lanche a bordo, por exemplo). Os principais itens levados em conta nesse critério são venda de passagens, transporte de carga, fretamentos e mala postal.

Guerra tarifária, alta do preço do barril de petróleo e crises econômicas externas, na avaliação de especialistas, explicam porque é difícil o setor aéreo ganhar dinheiro. Companhias aéreas, por sua vez, contestam o critério da Anac e afirmam que pode haver erro nos cálculos.

De acordo com a Anac, o anuário foi enviado para todas as companhias no início de maio. A agência informou que deu prazo a elas até o dia 20 de maio para contestações. Segundo a Anac, nenhuma empresa se manifestou nesse período e qualquer informação enviada que esteja errada e que exija uma nova versão está sujeita a penalidades como multa.

"Esse tipo de resultado não é exclusivo do Brasil. Esse é um setor que destrói valor, com excesso de capacidade, margens de lucro pequenas e forte influência de qualquer fator externo", afirma o especialista em aviação da consultoria Bain & Company, André Castellini.

Pelos dados da Anac, no ano passado a TAM teve o pior resultado de voo, negativo em R$ 840,7 milhões. Em contrapartida, a rival Gol obteve o melhor desempenho nesse critério, de R$ 376,4 milhões. A Azul também teve desempenho positivo, com R$ 57,4 milhões. Também tiveram perdas a Avianca (R$ 65,2 milhões), a Webjet (R$ 38 milhões) e a Trip (R$ 25,3 milhões).

"Quando você tem uma estrutura de custo adequada é possível fazer dinheiro", afirma o vice-presidente financeiro e de relações com investidores da Gol, Leonardo Pereira. De acordo com ele, a indústria em geral, no entanto, coloca mais capacidade do que pode absorver, o que leva justifica prejuízos como o apurado pelo anuário da Anac.

"Deve haver algum defeito nas planilhas. Temos registrado crescimento e lucro ao mesmo tempo", afirma o diretor de marketing e vendas da Trip, Evaristo Mascarenhas. Ele destaca que, no ano passado, a Trip registrou receita de R$ 747 milhões, o que corresponde a um crescimento de 66,2% na comparação com igual período do ano anterior.

A TAM também contesta os dados da Anac. "O dado que reflete a realidade dos resultados da companhia no Anuário do Transporte Aéreo é o que pode ser encontrado na planilha 4.2 - Demonstração do Resultado de Exercício -, onde lê-se que o lucro líquido das operações aéreas da companhia, no ano de 2010, foi de R$ 590 milhões", informou a companhia.

Para Castellini, contribuiu para o resultado negativo do setor aéreo, no ano passado, a intensa competição por tarifas mais baixas travada principalmente pela TAM e pela Gol, que respondem por cerca de 80% da demanda de vos domésticos.

"A disputa acirrada entre a TAM e a Gol se manifesta com mais capacidade de assentos. Mas como há gargalo nos aeroportos das principais cidades, essa capacidade adicional é colocada em mercados menos rentáveis", diz Castellini.

O anuário da Anac também mostrou a capacidade das empresas aéreas de honrar seus compromisso de curto prazo. É o índice de liquidez corrente, que mostra quantos reais a empresa tem para cada R$ 1 de dívida de curto prazo.

O Anuário da Anac é o principal levantamento sobre o setor aéreo brasileiro, mas seus dados foram considerados questionáveis por vários especialistas. A maioria deles diz que não acompanha a publicação, pois as informações não são auditadas.

“Os números não batem com os resultados informados nos balanços publicados pela Gol e pela TAM e, por isso, não consideramos também os dados divulgados pelas empresas de capital fechado”, afirma Caio Dias, analista do setor aéreo do Santander. Para ele, a diferença de padrões contábeis pode justificar as contradições entre os resultados. O analista acompanha as informações operacionais divulgadas no anuário, como market-share por rota.

Um analista que não quis se idenficiar disse que é possível que algumas companhias lancem receitas no demonstrativo operacional enviado à Anac que outras deixam de fora, o que pode distorcer a avaliação dos dados.

O consultor em aviação Nelson Riet diz que prefere monitorar o desempenho operacional das empresas aéreas pelo indicador Ebtidar, que mede o lucro antes dos impostos, depreciação e arrendamentos. No resultado de voos disponível no anuário da Anac, os custos com arrendamento de aeronaves são considerados.

A Anac diz que as informações foram enviadas pelas próprias companhias aéreas e que elas tiveram acesso aos números antes da publicação do anuário. Segundo a agência, nenhuma companhia fez qualquer retificação nas tabelas. Elas ainda podem solicitar correções, mas, se o fizerem, poderão ser multadas por enviarem informações incorretas à Anac.

Apesar do ceticismo em relação ao rombo das companhias aéreas apresentado no anuário da Anac, os analistas afirmam que, de fato, muitas enfrentam dificuldades para obter lucratividade em seus voos.

O crescimento de quase 25% na demanda no setor aéreo em 2010 veio acompanhado de uma competição acirrada, que trouxe uma queda no preço médio das passagens. Em 2010, a tarifa média foi a menos já registrada, de R$ 282,79 por trecho, uma queda de 18% ante 2009.

“As tarifas estão tão baixas que deixam as companhias sensíveis a qualquer tipo de contratempo, como problemas meteorológicos ou oscilações dos preços de combustíveis”, diz o especialista em aviação Osvaldo Ribeiro.

O aumento da concorrência entre as líderes de mercado TAM e Gol e com companhias em fase de ascensão, como Azul, Webjet , Avianca e Trip, tem inviabilizado a reposição das tarifas no mesmo ritmo que a elevação dos custos.

A dificuldade em elevar a lucratividade afeta também as empresas estrageiras. O terremoto no Japão e aa elevação do combustível fizeram as companhias reduzirem sua projeção de lucro para este ano em 50%, anunciou a Iata (associação das companhias aéreas intenacionais) há cerca de um mês.

Se esse desafio já é difícil para as grandes companhias, as empresas menores enfrentam dificuldades ainda maiores. Apenas no ano passado três companhias encerraram as operações regulares – Cruiser, Air Minas e Rico.

Ainda de acordo com essa avaliação, entre as empresas de transporte aéreo de passageiros, a Gol teve a melhor performance, com R$ 1,54. Em segundo está a Trip (R$ 0,97), seguida pela Webjet (R$ 0,94), Avianca (R$ 0,65), TAM (R$ 0,64) e Azul (R$ 0,50).

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